DESTAQUEDicasEnvelhecerNews

COMO ENCARAR E ENVELHECER PELO GERIATRA DR. MORIGUCHI

 

Uma das maiores autoridades em geriatria, fala sobre

como encarar a velhice – Dr. Emílio Moriguchi

 

Mariana Kalil, publicou uma excelente entrevista na revista Donna, com uma das maiores autoridades do Brasil em geriatria, Dr Emilio Moriguchi, 59 anos. Formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com pós-graduação nos Estados Unidos, e estudos na Suíça e no Japão. Filho e herdeiro natural dos ensinamentos do mestre Yukio Moriguchi, o pai da geriatria no Estado, fundador do Instituto de Geriatria e Gerontologia (IGG) do Rio Grande do Sul.

Nesta extensa entrevista, uma verdadeira aula de como envelhecer com qualidade de vida. O caminho do envelhecer bem, segundo o geriatra, passa pela “alimentação, estilo de vida, repouso, lazer, mas, acima de tudo, ter uma cabeça sã e um bom estado de espírito – requisitos fundamentais.”

 

Leia a entrevista completa

 

 

Donna – O senhor é professor visitante da cidade de Oklahoma, no Japão. Durante dois meses por ano, em fevereiro e outubro, viaja para o outro lado do mundo para dar aulas a estudantes de medicina e enfermagem. É convidado porque há alguns conhecimentos e conceitos esquecidos pelos profissionais japoneses. Quais são eles?

Emilio Moriguchi – O relacionamento humano e a importância do coração. Não o órgão, mas o sentimento. São disciplinas que enfocam a importância de se relacionar com os pacientes.

 

Donna – O senhor está dizendo que, em um país altamente tecnológico como o Japão, foi esquecida a importância do afeto na relação médico-paciente?

Moriguchi – Exatamente. Os alunos e os médicos desconhecem ou esqueceram. O Japão tem os melhores hospitais do mundo. Trata-se de um país altamente desenvolvido em tudo. Na questão da saúde, ninguém espera para ser atendido – e este atendimento é bastante socializado e justo. O funcionário que acabou de entrar na empresa, por exemplo, recebe o mesmo atendimento e no mesmo balcão que o presidente desta mesma empresa. Quanto a isso, está tudo certo. Porém, falta calor humano.

 

Donna – O senhor pode ser mais específico?

Moriguchi – O paciente chega ao hospital e é direcionado para o setor de enfermagem, que mede os sinais vitais. Simultaneamente, o computador vai gerando o checklist e os tipos de exames que precisam ser realizados. Então, o paciente sai dali e vai direto para o laboratório com a requisição em mãos para coletar o sangue. Em seguida, leva o resultado para o médico, que avalia e, se necessário, já o encaminha para outros exames que o paciente realiza imediatamente. É tudo muito rápido e extremamente eficiente.

 

 

Donna – E sem nenhum tipo de diálogo, pelo visto…

Moriguchi – (risos) O paciente sai da consulta extremamente satisfeito com a eficiência do serviço, mas sem sequer ter trocado uma palavra com o médico. Durante todo esse período, não se abriu espaço para um breve diálogo que seja. O paciente não foi ouvido, não teve a oportunidade de falar dos seus medos, das suas angústias, de nada.

 

Donna – O senhor considera essa relação médico-paciente tão importante quanto um serviço altamente eficiente?

Moriguchi – Em muitos casos, o problema do paciente é fundamentalmente emocional. Não há nada de errado com a saúde dele, ou até existem alguma alterações, mas são consequência de questões psicológicas que ele vem enfrentando. Se não consegue dialogar, não consegue resolver. É justamente por isso que os japoneses me pediram para começar a ministrar essas disciplinas de relação humana.

 

Donna – Tem uma clínica no centro de Tóquio que leva o seu nome, um reconhecimento público de que os seus ensinamentos nesses dois meses em que leciona no país são fundamentais para a evolução da medicina japonesa como um todo. Como funciona na prática o seu trabalho na clínica?

Moriguchi – Basicamente da mesma maneira que funciona aqui. Enfocamos muito a relação médico-paciente, a importância da empatia, de se colocar no lugar do outro para tentar compreender do que ele precisa, o que sente. A primeira pergunta que sempre faço aos meus pacientes, seja no Japão ou no Brasil, é: “Em que posso lhe ajudar?”. Na hora em que ele começa a falar, você tem que estar apto e disposto a ouvir.

Muitas vezes acontece de um paciente chegar com indicação de tratamento para colesterol alto ou pressão alta e logo percebo que é tudo decorrência de algum problema familiar ou profissional. Ao entender o funcionamento daquela pessoa como um todo, consigo tratá-la melhor na sua necessidade.

A clínica Emilio Moriguchi é conhecida no Japão como o lugar que trata o coração. Não o órgão, mas a alma.

 

Donna – O senhor anda sempre com dois celulares?

Moriguchi – Sempre (risos). É para evitar as áreas de sombra. Dou os números dos meus celulares para os pacientes particulares e do SUS. Me coloco sempre à disposição, afinal de contas, estou aqui para ajudar. Tem algumas pessoas que abusam (risos), mas a maioria se dá conta de que não é para abusar, e eu sempre estou às ordens. Esse interessar-se, o querer o bem, o serviço ao próximo é um espírito que se perdeu muito no Brasil, no Japão, em qualquer lugar.

 

Donna – O senhor aprendeu a colocar em prática esses valores aqui no Brasil?

Moriguchi – Eu nasci no Japão, vim para cá com 10 anos e me criei aqui. Este lado mais afetivo e mais humano certamente é decorrência do meu aprendizado inserido na cultura brasileira. Por outro lado, tive uma educação extremamente rígida do meu pai, que está se aposentando agora com 90 anos (Emilio é filho do professor Yukio Moriguchi, o pai da geriatria no Rio Grande do Sul).

Ele é um japonês muito exigente que nunca permitiu ter o filho fora da linha, sobretudo o mais velho, que sou eu. Somos quatro irmãos, e eu era sempre o primeiro a ser cobrado e a apanhar, se fosse o caso (risos). Eu tinha que dar o exemplo. A disciplina e a ordem japonesas associadas ao calor humano brasileiro forjaram a pessoa e o profissional que eu me tornei.

 

Donna – Disciplina e ordem o senhor tinha em casa. Mas e o calor humano? Onde aprendeu?

Moriguchi – No ano de 1968, quando chegamos aqui em Porto Alegre, não sabia falar português. Meus pais me matricularam em um grupo escolar na frente do antigo prédio da Brahma, ali na Cristóvão Colombo. Ninguém conseguia falar comigo. Eu era um ser humano incomunicável. Havia um rapaz chamado Hugo que era a única pessoa que, sem abrir a boca, me levava para almoçar, mostrava onde era o banheiro, essas coisas básicas de sobrevivência. Ele me ajudou muito em tudo. Aquele calor humano me marcou demais – até porque era desconhecido para mim. Aos 10 anos de idade, aprendi com o Hugo como devemos tratar o próximo.

 

Donna – O senhor formou-se em medicina na UFRGS e voltou ao Japão para fazer doutorado. Quando chegou lá, já se sentia diferente dos médicos japoneses?

Moriguchi – Muito, e essa diferença era visível. Todos vinham comentar como eu tinha me tornado um profissional distinto, sobretudo porque falava com os pacientes. Coisas triviais, do tipo “como anda a vida?” ou “como está em casa e no trabalho?”. Eles diziam que isso não era papel do médico.

 

Donna – O senhor realiza um trabalho voluntário para atender a população agrícola japonesa do sul do Brasil. Percorre uma área de quase 4 mil quilômetros de estrada de terra para estar presente em colônias japonesas espalhadas por Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Gostaria que contasse como isso tudo começou.

Moriguchi – Quem iniciou este trabalho foi meu avô, em 1930. Ele foi o primeiro médico enviado pelo governo japonês para atender os imigrantes japoneses que não falavam português. Naquela época, ficou baseado em São Paulo e passava o ano inteiro a bordo de um jipe percorrendo da Amazônia ao Chuí. Quando completou 60 e poucos anos, foi diagnosticado com diabetes e soube que não viveria por muito mais tempo. Então, chamou meu pai para dar continuidade ao trabalho. Foi por isso que viemos para o Brasil.

À medida que os anos foram passando, os japoneses do Norte foram desaparecendo, alguns migraram para São Paulo e Paraná, e as colônias do Rio Grande do Sul e Santa Catarina ficaram sem assistência médica. Há 10 anos, quando meu pai completou 80, designou a mim esse atendimento. Trata-se de um trabalho voluntário que realizamos na época de inverno e tenho a companhia de alunos de Medicina e Enfermagem do Japão.

Desde 2009, eles vêm para cá me acompanhar nessa jornada. Foi quando perceberam o atendimento médico mais humano e sugeriram que eu levasse como disciplina para o Japão.

 

 

 

Donna – A esperança de vida tem aumentado no mundo inteiro e o Brasil compartilha dessa mudança demográfica. Já se calcula dois bilhões de idosos em 2050. O senhor afirma que o envelhecimento com qualidade de vida é uma conquista que depende do esforço individual e coletivo na busca de hábitos saudáveis. Que hábitos são esses?

Moriguchi – É um conjunto que inclui alimentação, qualidade de vida, repouso, lazer, mas, acima de tudo, ter uma cabeça sã e um bom estado de espírito – requisitos fundamentais e tão esquecidos hoje em dia. Fundamos recentemente no Hospital de Clínicas um grupo de espiritualidade em Medicina, que consiste justamente em trabalhar todos esses quesitos para ajudar os pacientes a envelhecer bem e com saúde.

 

Donna – Veranópolis é a cidade mais longeva do Brasil, onde a expectativa média de vida é de 72 anos. Nesta comunidade, onde há muitos idosos, as pessoas envelhecem bem: com saúde, participando da comunidade. Toda a comunidade, inclusive os jovens, respeitam muito os idosos. Com base em seus estudos realizados em Veranópolis desde 1994, o que o senhor conclui de mais relevante no processo do envelhecimento saudável?

Moriguchi – O que aprendemos ao longo de todos esses anos com os idosos de Veranópolis é que são trabalhadores, alimentam-se sobriamente com os alimentos que eles próprios produzem, fazem bastante atividade física. Há uma unidade familiar, que é a parte de integração social, que fazem com que sejam ouvidos e respeitados por todos. Além disso, desfrutam de momentos de repouso e lazer, quando gostam de se reunir com amigos e com a família, e desenvolvem a espiritualidade, que é ter fé e saber que, mesmo dentro do sofrimento, tudo tem algum sentido.

 

Donna – O senhor concorda que o estresse é um dos maiores ladrões de vida que nós temos? Por quê? Como amenizá-lo?

Moriguchi – Meu pai sempre me disse que há duas coisas que não caem do céu: dinheiro e saúde. Realmente, são duas coisas que precisam ser batalhadas. No dia a dia estressante que levamos atualmente, é preciso lutar para ter uma alimentação saudável, momentos de lazer, tempo para a família.

Claro que o trabalho é importante. Mas não pode ser tudo. Hoje à noite, por exemplo, combinei de jantar fora com minha esposa. Fechei minha agenda a partir das 18h justamente para isso. Precisa de planejamento? Claro que sim. Eu poderia ficar trabalhando, como sempre fico.Mas encontrar tempo para cuidar das pessoas que são importantes para nós contribui para nossa saúde e paz de espírito.

No dia a dia estressante que levamos atualmente, é preciso lutar para ter uma alimentação saudável, momentos de lazer, tempo para a família

 

 

Donna – O senhor é religioso?

Moriguchi – Meu pai é bastante católico. Sempre rezou muito. Passamos por momentos de muita dificuldade e certamente o que o manteve em pé foi a fé. Quando viemos para o Brasil, ele ficou os primeiros três anos sem trabalhar, pois precisava revalidar o diploma. Vivíamos com suas economias. Minha mãe me acordava às 4h para ajudá-la a fazer pão, já que não tínhamos dinheiro nem para isso – e eu era o irmão mais velho.

Tudo para que, quando meu pai e meus irmãos acordassem, o alimento estivesse na mesa. Ele sofria muito por não conseguir dar tudo o que desejava para a gente, mas estava sempre com o terço na mão, rezando. Herdei essa fé e essa espiritualidade dele. Afinal, ele sempre foi o meu exemplo.

 

Donna – Como exerce a sua fé?

Moriguchi – Sempre que posso, vou à missa aos domingos. Quando estou envolvido com as consultas pelo Interior, não tenho tempo. Nesse caso, dou prioridade para o atendimento médico – e acredito que Deus fica muito mais contente por eu priorizar as pessoas. Mais importante de tudo é viver a caridade e exercer o amor ao próximo.

Donna – O isolamento mata?

Moriguchi – Pode não matar do ponto de vista cronológico. Pode não matar o físico, mas mata a alma. Um idoso em uma instituição, por exemplo, pode viver mais do que se estivesse na rua. Mas morre em seu espírito. No momento em que um idoso fica isolado, perde sua alma. Como professor de Geriatria, ministro uma disciplina que se chama Promoção e Proteção da Saúde do Adulto e do Idoso. Tem como objetivo ensinar o relacionamento com os idosos. Nosso trabalho, às segundas e quartas-feiras, é acompanhar os alunos a asilos para que eles conversem com esses idosos a fim de saber por que estão lá e se precisam de alguma assistência. É impressionante o feedback. O que a maioria quer é apenas alguém com quem conversar. Salvar as pessoas do isolamento também nos ajuda a viver mais.

Donna – O senhor diz que não gosta muito do termo “terceira idade”. Por quê?

Moriguchi – Parece terceira classe, né? (risos). Dá um tom muito pejorativo. Mas não é que eu não goste – é que está errado. Não existe primeira, segunda e terceira idade. A idade é algo contínuo, e a gente começa a envelhecer no momento em que é concebido dentro do útero da mãe. O hábito de vida da mãe impacta diretamente no perfil de doenças do adulto. Se a mãe é fumante, não se cuida, é obesa, não pratica atividade física, esse feto, depois que nasce, tem muito mais probabilidade de ficar doente do que um feto que foi gestado por uma mãe com hábitos de vida saudáveis.

 

 

Donna – E o termo “melhor idade”, o que o senhor diz a respeito?

Moriguchi – Essa é outra mentira! Fico furioso quando ouço essa expressão (risos). Pode ser para alguns, mas para a maioria não é a melhor idade. A gente começa a ter uma série de limitações – e algumas pessoas compreendem, mas outras não. No Japão, onde há uma cultura antiga de respeito aos idosos, não existe essa história de terceira idade, melhor idade. No Japão se usa muito os metais nobres para comemorar as idades. Quem passa dos 65 anos chega à idade da prata. Quem passa dos cem, chega à idade do ouro. Essa concepção de uma idade contínua, com conquistas a serem comemoradas ao longo da vida, é muito mais saudável. Envelhecer tem que ser uma conquista – e para conquistar as medalhas de prata e ouro temos que lutar. É aquilo que falávamos no início da nossa conversa: ter saúde e hábitos saudáveis exige dedicação e disciplina.

 

Donna – O senhor luta para conquistar a medalha de ouro?

Moriguchi – Estou com 57 anos e pretendo trabalhar pelos próximos 40. Ou seja: batalho para isso. Meu pai está com 90 inteiraço. Ele vai ganhar a medalha de ouro, certamente.

 

Donna – O doutor Yukio Moriguchi recebeu o título de Professor Emérito, maior honraria acadêmica fornecida aos professores aposentados que atingiram alto grau de projeção em atividade. Qual é o maior legado que o seu pai deixa na sua opinião?

Moriguchi – Trazer a geriatria clínica preventiva para o Brasil, mostrando que o envelhecimento exige cuidado e batalha. Em 1971, quando recebeu o direito de clinicar no Brasil, o então reitor da PUCRS convidou meu pai para criar a primeira disciplina de geriatria do país. Naquela época, ele já pregava a prevenção, a dieta saudável, a necessidade de caminhadas diárias – algo de que tanto se fala hoje em dia.

 

Donna – É aos 20 anos que o ser humano começa biologicamente a envelhecer de fato?

Moriguchi – O envelhecimento começa já na barriga da mãe. É quando o relógio cronológico dispara. Se formos dividir em termos práticos – crescimento, maturação, envelhecimento -, atingimos o pico do crescimento e maturação ao redor de 30 anos. Depois, exceto o cérebro, que continua se desenvolvendo, a parte biológica começa a declinar. Atingimos o pico da sabedoria, da atividade cerebral, ao redor de 60, 70 anos. É interessante: enquanto o biológico declina, nossa capacidade intelectual segue a pleno vapor até esta idade.

 

Donna – Então é praticamente um crime o ser humano se aposentar com 60 anos.

Moriguchi – Sim. Eu sou um grande incentivador da aposentadoria tardia.

 

Donna – O senhor indica um geriatra por volta de que idade?

Moriguchi – Preventivamente, quanto mais precoce, melhor. Como o pico do crescimento e da maturação é atingido aos 30 anos, recomendo que este acompanhamento comece a partir dos 40. É a idade em que as funções biológicas começam a apresentar declínio, e a gente precisa aprender a se adaptar. Tenho pacientes de 80 anos que são maratonistas, mas sabem dos seus limites porque estudam e se interessam. Infartos, derrames, câncer, Alzheimer: tudo pode ser prevenido. Mulheres de 40 anos são a maior parcela das minhas pacientes particulares.

 

 

 

Donna – As mulheres têm mais consciência em relação à prevenção?

Moriguchi – Sim, por causa do hábito de ir ao ginecologista desde cedo. O homens geralmente buscam acompanhamento depois dos 50 e já aparecem com algum problema. O ideal seria que começassem aos 40.

 

Donna – Reposição hormonal é um bom negócio? A partir de que idade?

Moriguchi – É algo bastante controverso. A natureza é muito bem feita. Não por acaso existe a menopausa, também conhecida como o fim do período fértil, que se instala entre os 45 e 55 anos de vida da mulher. A menopausa tem um imenso significado biológico. Os picos de estrógeno que as mulheres têm na fase fértil são o que induz ao risco de algumas doenças, entre elas o câncer de mama. A curva dos novos casos de câncer de mama vai aumentando até a menopausa – e, quando a atinge, começa a decrescer. Por quê? Porque a mulher deixa de atingir aqueles picos de estrógeno. A menopausa, portanto, é algo que a natureza propicia para as mulheres para que elas possam viver mais. Os homens não se dão conta, mas também sofrem de uma espécie de menopausa masculina, a chamada andropausa.

 

Donna – Esta seria a próxima pergunta: andropausa. À medida que os homens experimentam queda nos níveis de testosterona, os hormônios femininos aumentam – causando irritabilidade, tendência à depressão, diminuição da capacidade de processamento mental, antissocialização. Por que se fala tão pouco nisso?

Moriguchi – Como os homens não menstruam, acabam não se dando conta da chegada da andropausa. Daí começam a ouvir que estão ficando rabugentos, chatos, esclerosados, que estão na crise da meia-idade. A ajuda se dá a partir do acompanhamento médico, que pode detectar a andropausa por meio de exames, como colesterol, que, por incrível que pareça, diminui depois da andropausa, para que ele seja mais protegido do risco de infarto e tenha a possibilidade de viver mais. Outra lição da sábia natureza.

 

Donna – O senhor está dizendo que a reposição hormonal é perigosa porque vai contra a natureza?

Moriguchi – Se as mulheres têm sintomas de menopausa muito intensos, que atrapalham a qualidade de vida, é óbvio que a gente tem que medicar durante aquele período, de aproximadamente um ano. O problema é que muitas mulheres continuam fazendo uso indiscriminado de hormônios por cinco anos ou mais – e depois de cinco anos tomando hormônios há comprovadamente o risco de desenvolver câncer de mama. No caso do homem, geralmente não há necessidade de reposição, mas, quando isso acontece, aumenta tremendamente o risco de câncer de próstata, além de aumentar bastante a pressão arterial. Por isso digo que reposição hormonal é algo muito delicado. Tem que ser muito bem indicado, por um profissional competente, para tratar o sintoma certo e por um período limitado.

 

 

Donna – E a mania das vitaminas?

Moriguchi – Está comprovado que quem ingere polivitamínico sem orientação médica tem mais risco de infarto, câncer e morte súbita. A reposição deve ser feita depois que o paciente submete-se a exames – e só com aquelas vitaminas de que ele precisa. A dieta saudável propicia as vitaminas necessárias – e esta é outra lição de Veranópolis. Os idosos saudáveis não fazem reposição indiscriminada de vitaminas. Já os que estão doentes hoje, fizeram.

 

Donna – Cite três alimentos que deveríamos comer desde sempre.

Moriguchi – Antes de responder a essa pergunta, convido você a voltarmos um pouco no tempo. Esquecemos que fazemos parte da natureza. Há todo um estudo de palio medicina e há uma dieta chamada Paleolítica que moldou o nosso genoma há cerca de cem mil anos. Primeiro, a gente só comia quando tinha fome. Não existia essa história de comer três vezes por dia. Segundo, comia-se sobriamente, porque tinha que dar para todos. Terceiro, comia-se o que a natureza oferecia – e não eram gorduras trans ou alimentos industrializados. Vários estudos mostram que a dieta saudável exige não comer demais. Vai almoçar no bufê e quer repetir? Só pode a salada, porque salada o homem sempre comeu. Planta, folhas sempre existiram – e o homem sempre se fartou com elas.

 

Donna – E a carne?

Moriguchi – Está permitida, mas moderadamente. Nossos ancestrais só comiam carne quando caçavam o animal – e era difícil, não era todo dia. Hidrato de carbono comia-se pouco. Batatas e cereais só entraram na dieta recentemente, cerca de 10 mil anos atrás. Podem ser consumidos de forma sóbria. Hoje, fazemos tudo ao contrário. Comemos um monte de hidrato de carbono, como pão e massa. Está errado. Proteínas e hidrato de carbono devem ser ingeridos o mínimo necessário.

 

Donna – O que o senhor tem a dizer da comida industrializada?

Moriguchi – Evite ao máximo! Principalmente os óleos industrializados, que fazem muito mal. A gordura trans é um veneno. É o que mais entope nossas artérias, muito mais do que o colesterol. Outra coisa é o refrigerante. Em vez de sacarose, que é o açúcar natural, os fabricantes colocam frutose. É um tipo de açúcar que causa dependência no cérebro e leva à disfunção das artérias, o que propicia mais depósito de colesterol. Uma dieta saudável caracteriza-se pela quantidade sóbria de alimentos, ingestão de comidas naturais e refeições em ambientes saudáveis, de boa socialização.

 

Donna – Devemos preferir as folhas verde escuras?

Moriguchi – Sim. Quanto mais escura é a folha, mais nutrientes ela tem. O brócolis é muito mais nutritivo do que a couve-flor. A alface americana, aquela alface esbranquiçada, é um zero à esquerda no quesito nutrientes. A couve é excelente. Com o vinho acontece a mesma coisa. O tinto é muito mais saudável e tem muito mais nutrientes do que o branco.

 

Donna – Correr envelhece, como anda se pregando por aí?

Moriguchi – Não. Mas o ideal é que a gente não invente de fazer muito mais do que fazia antes dos 30 anos. Tenho pacientes maratonistas com 80 anos, mas eles sempre correram, desde a juventude. Eu não recomendaria uma pessoa começar a correr maratona com 60 anos. Qualquer atividade física sempre ajuda a envelhecer melhor.

 

 

 

Donna – Sendo oriental, como o senhor enxerga essa cultura ocidental de dar mais valor para a beleza externa do que para o bem-estar interior? Até que ponto é saudável essa busca pela eterna juventude?

Moriguchi – A eterna juventude não existe. Costumo chamar quem vende essa ideia de mercador de ilusões. Triste é constatar que há muita gente que paga fortunas para esses mercadores de ilusões. Rejuvenescimento é um termo que deveria ser banido. Rejuvenescimento é uma mentira. O que existe é o envelhecimento saudável, que pode se conseguir com hábitos saudáveis de vida. É impossível parar o tempo e nosso relógio biológico. Atualmente, há alguns hábitos de vida que ajudam a prolongar o relógio biológico. Estou dizendo prolongar, não rejuvenescer.

 

Donna – Que hábitos são esses?

Moriguchi – Meditação, por exemplo. Artigos recentes atestam que a prática da meditação ajuda a prolongar o relógio biológico e a viver mais.

 

Donna – Conte sobre a sua rotina.

Moriguchi – Acordo por volta de 6h. Vou para a cozinha, bebo um café forte e faço suco de laranja natural na companhia das minhas duas filhas enquanto elas preparam um sanduíche de pão com ovo, muito comum no Japão. O Japão é um dos países que mais consomem ovo – e o pessoal há pouco ainda dizia que ovo faz mal… Não tem nada disso! Então, eu como sanduíche, café, suco de laranja e saio para trabalhar. Alguns dias, nem almoço.

Quando almoço, é na companhia dos residentes no hospital. Minha rotina costuma se estender até 22h. Minha esposa me espera, jantamos juntos e vou para o computador responder e-mails até as 2h da madrugada.

 

Donna – Dorme só quatro horas?

Moriguchi – O tempo médio de sono ideal é de sete a oito horas por noite. Essa média tende a diminuir com a idade. Mas cada caso é um caso. Comecei a dormir quatro horas por noite quando fiz meu doutorado e acabei me acostumando. Mas eu não sou exemplo para ninguém, viu? (risos)

 

 

Donna – O senhor faz caminhadas?

Moriguchi – Nunca uso o elevador. Independentemente do número de andares, só me movimento pela escada. Tem uma regra consagrada no Japão que manda caminhar 10 mil passos por dia. A maioria dos japoneses segue à risca. Acredita-se que seja o necessário para uma vida saudável. Meu celular tem um contador de passos e está sempre no meu bolso. (Ele tira o celular do bolso e mostra o aplicativo que conta os passos.)

 

Donna – Agora são quase duas da tarde e o senhor caminhou 3.861 passos. Falta um bocado para os 10 mil, hein?

Moriguchi – Mas vou subir e descer escadas e caminhar bastante hoje ainda no hospital (risos). Se não conseguir completar 10 mil passos, quando chegar em casa, termino o que ficou faltando em cima da esteira (risos). Rejuvenescimento é um termo que deveria ser banido. Rejuvenescimento é uma mentira.

O que existe é o envelhecimento saudável, que pode se conseguir com hábitos saudáveis de vida. É impossível parar o tempo e nosso relógio biológico.

Fonte:Donna

4 thoughts on “COMO ENCARAR E ENVELHECER PELO GERIATRA DR. MORIGUCHI

  • Achei muito interessante essa entrevista.
    Parabéns doutor Moriguchi.

    Resposta
  • Theresinha martinelii

    Tenho 81 anos adorei

    Resposta
  • Muito Bom aprendi muito

    Resposta
  • Alice Monaco Cardoso

    Achei muito importante. São orientações excelentes. Aprendi muito.

    Resposta

Gostou do Artigo?? Deixe o seu comentário!!

Pular para o conteúdo